quarta-feira, 1 de maio de 2019

Lita num passeio na Ribeira da Aldeia


Em maré de recordações, muito de acordo com o passar dos anos, hoje avanço com a memória de alguns amigos da minha Lita, que vim a conhecer desde que a encontrei por artes que só Deus saberá. Motivos de convívio, razões de passeios e momentos de alegria surgiam frequentemente, deixando marcas indeléveis nas nossas vidas.
A Lita, ainda jovem e sempre jovial, lá está no moliceiro num dos canais da ria de Aveiro. Toda a gente se mostra feliz. Familiares e amigos, que, entretanto, nos deixaram, ficando os seus sorrisos e gestos de estima e amor nos nossos corações.
Em cima, a tia e madrinha Zulmira, o tio Fonseca; ao centro, a Isaura e a Esmeralda, a Lita e a amiga e vizinha Adelaide; depois, a tia Lurdes, a Letinha de Pardilhó, o vizinho Alberto Gomes (marido da Adelaide) e a tia Aidinha. O passeio aconteceu na Ribeira da Aldeia, Pardilhó, provavelmente há 60 anos.

quinta-feira, 25 de abril de 2019

25 de Abril: Para não cair no esquecimento


Em 25 de Abril de 1974 alguns militares politicamente mais esclarecidos, os «Capitães de Abril» como ficaram na história, descontentes com a guerra colonial e com algumas leis que afetavam os oficiais de carreira, conspiraram e levaram a cabo uma revolta com o objetivo de instaurar um regime democrático em Portugal.
Vivíamos numa ditadura corporativa, voltados para África, na senda de um regime que se proclamava de «orgulhosamente sós», na defesa de um país que se afirmava multirracional, multicontinental, uno e independente.
O analfabetismo era muito. O atraso em relação à Europa era enorme. A guerra colonial, com tudo o que ela teve de mau, gerou descontentamento geral entre o povo, sempre o mais sofredor. A incapacidade de os nossos governantes se adaptarem às correntes do pensamento então dominantes, era notória. A aceitação da autodeterminação das nações africanas era impensável. Tudo isso levou ao Golpe de Estado, seguido de uma Revolução.
Os militares, que, eventualmente, apenas estariam interessados em acabar com a guerra e estabelecer a democracia entre nós, viram-se ultrapassados com o regresso de exilados políticos, nomeadamente, Mário Soares e Álvaro Cunhal, e com as festas do 1.º de Maio, pela primeira vez celebrado em liberdade em Portugal, com a expressão que lhe era devida.
Partidos políticos assumem a liderança do processo, de mãos dadas com os militares ou contra eles, e Portugal foi bandeira de uma revolução sem muito sangue.
O MFA declara, como essência dos seus projetos, Democratizar, Descolonizar e Desenvolver o País. A democratização, com altos e baixos no pós-revolução, foi criando raízes, ultrapassando ideias totalitárias de minorias irrealistas; a descolonização tem sido (mal) explicada pelos que a fizeram, sem conseguirem libertar-se das “raivas compreensíveis” de centenas de milhares de portugueses que se viram obrigados a fugir de populações em fúria e ávidas de liberdade, sem que nada tivesse sido feito em favor de quantos nas colónias respeitaram os indígenas, através dos séculos; e o desenvolvimento, que muitos não veem ou não querem ver, a vários níveis, ainda não teve a coragem de erradicar a pobreza de enormes faixas da população. E se é verdade que hoje se vive muito melhor do que antes do 25 de Abril, também temos de reconhecer que, em pleno século XXI e 45 anos depois de Abril, 20 por cento dos portugueses passam fome e estão privados do que é essencial e próprio de uma vida digna.
Com o 25 de Abril abre-se uma nova era na comunidade nacional. A liberdade voltou, os partidos políticos nascem como cogumelos, as colónias tornam-se independentes, as greves e os movimentos reivindicativos sucedem-se, as ideologias até então reprimidas voam por todos os cantos, a economia perde o norte, os golpes e contragolpes multiplicam-se e um ano depois reúne-se a Assembleia Constituinte, que nos dá a Constituição para um novo período da nossa história.
Novas mentalidades e maneiras de ver e de ser brotam com força, o ensino democratiza-se, a justiça social manifesta-se, a reintegração dos portugueses estabelecidos nas colónias e forçados a regressar a Portugal, de livre vontade ou fugidos, é um exemplo para muitos.
Com novas mentalidades, com a mulher a seguir, legitimamente, uma carreira profissional, as famílias viram-se forçadas a reestruturar os seus ambientes. Surgiram novas instituições para responder às necessidades das famílias e outras tiveram de se readaptar às circunstâncias.
A Escola e a vida aceitam a democracia e o país olha mais para a Europa. E na linha da frente, como noutras épocas históricas, a Igreja Católica ocupou o seu espaço na proclamação e na vivência das suas doutrinas e no apoio, sobretudo, aos que mais sofrem.
A Gafanha da Nazaré não ficou indiferente à revolução. A adesão foi bastante expressiva, tendo surgido na altura os diversos partidos nascidos com a democracia de Abril. Novas mentalidades valorizaram o espírito democrático e o povo tornou-se mais aberto e mais participativo. Novos horizontes se instalaram entre as populações aqui radicadas.

Fernando Martins

Do livro “Gafanha da Nazaré — 100 anos de vida” com ligeiras adaptações

segunda-feira, 15 de abril de 2019

Notas do meu diário — Recordações da Páscoa


1. A Páscoa celebra, como é sabido, o grande mistério da nossa fé. Há um período, a Quaresma, que nos prepara para isso. Já no fim, o Tríduo Pascal congrega-nos intensamente para a vivência da paixão e morte de Jesus. Silêncio, meditação e oração, com jejuns, abstinências e partilhas, tornam mais expressiva a fé que de Deus no vem para em comunhão com todos construirmos um mundo melhor. Dir-se-á que esse propósito nos deve animar nos passos da nossa existência terrena. Para mim, a Páscoa é sempre uma mais-valia para o aprofundamento do meu envolvimento nos projetos da construção de uma sociedade mais fraterna, mais humanista. Por isso, valorizo de modo especial a festa maior do cristianismo. Maior, porque é da Ressurreição de Jesus Cristo que dimana a razão da nossa fé, dom de Deus ofertado a todos os homens e mulheres de boa vontade. Eu preciso da Páscoa. 

2. Fui educado desde menino para olhar a Quaresma como tempo de espera serena, de confiança absoluta na alegria de que da Ressurreição nos vinha para nosso conforto espiritual. Era o tempo das confissões em massa, das orações pelas almas do purgatório, cantadas de porta em porta, com recolha de dádivas para mandar celebrar missas. Tempo sem festas populares e de maior atenção aos que sofriam no corpo e na alma. Também tempo dos folares feitos no fim de semana que antecedia o domingo de Páscoa. Folares para a família e para os afilhados de quem os tinha. Tantos ovos quantos os aniversários. É certo que em determinada altura não havia espaço para tanto ovo, mas também é verdade que há uns 70 anos se casava mais cedo. Os folares eram feitos com algumas liturgias e orações na hora de entrarem no forno. E depois de feitos, ficavam na gamela onde era feita a massa, cobertos por uma tolha. Comê-los, só no dia de Páscoa. Ao saírem do forno, lá vinha uma pequena prova de um folarinho feito do resto da massa que não chegou para mais um folar. Um bocadinho para cada um. 

3. Por essa altura, bem como na altura de outras festas profanas e religiosas, vinham uns rebanhos, julgo que de serras mais próximas. A matança dos borregos e cabritos era feita em pátios de alguns lavradores. A carne, vendida a retalho, era assada nos fornos a lenha, de sábado para domingo. Era o almoço festivo por excelência. Para todos? Nem por isso. Só para os que podiam. Recordo que algumas famílias mais pobres compravam as partes que os outros não queriam. Como sempre acontece. Mas havia quem optasse por bons galos e galinhas velhas que no forno a lenha as carnes se tornavam tenras. E também havia quem criasse os seus próprios cordeiros e cabritos, ou ovelhas e cabras. 

4. A Páscoa era motivo de festa. Os afilhados visitavam os padrinhos e madrinhas, retribuindo com uma lembrança os folares recebidos. Tenho presente que a minha mãe comprava garrafas de vinho do Porto. Na memória tenho registado a marca Velhotes, onde se via, no rótulo, uns velhos a saborear o precioso néctar. E lá íamos, meio envergonhados, não sei porquê, pedir a bênção aos padrinhos e madrinhas, dizendo assim: — Dê-me a sua bênção, senhor padrinho (madrinha). E ele (ela) respondia: — Deus te abençoe e te faça um santo. 

5. Depois havia a visita pascal. O senhor Prior e algum padre amigo visitavam todas as casas dos crentes, onde aspergiam as pessoas com água benta e davam a cruz de Cristo ressuscitado a beijar, envolvido em flores. Um paroquiano recolhia as ofertas, que fazia parte da côngrua, forma de sustento do pároco. As ofertas eram à base de ovos e géneros agrícolas. Durante a semana, vinham os negociantes que traduziam em dinheiro as dádivas recebidas. Muito mais tarde tudo isso passou à história. 

6. Um ano houve mudança de prior. Veio um padre mais novo, Eira Bastos,  substituir o prior Guerra. Queria modernizar estes hábitos, pois se dizia que os ovos do folar da Páscoa mais o grosso da côngrua que era feita no final das colheitas não eram o suficiente. Mas ele, o novo pároco, teve uma ideia curiosa. Na recolha do folar, na visita pascal, deixou um ovo em cada casa com o seguinte recado: — Este ovo é para pôr debaixo da galinha quando ela estiver a chocar os ovos e o pinto que nascer e crescer é para substituir o habitual folar dado ao prior… O pessoal ria-se com o jeito do padre, que no ano seguinte terá recebido uns bons galos. Se não recebeu assim tantos, foi aposta perdida. 

7. Já há anos, com o desenvolvimento demográfico, a visita pascal evoluiu e bem para o envolvimento dos leigos nesta tarefa de tanto significado para os católicos. É tudo feito rapidamente, na simples manhã de domingo de Páscoa. É certo que há muitas casas de emigrantes fechadas, há famílias com raízes noutras paróquias, onde celebram as festas, há porventura menos vivência dos mistérios pascais. Os tempos são realmente outros. As tradições vão caindo no esquecimento e muitos nem sequer as conhecem. No entanto, há marcas pascais que ainda se mantêm. Não hão de faltar folares e amêndoas em todas as mesas e as famílias ainda se reúnem para degustar cabrito ou cordeiro assado. Já não é mau. Cá por casa haverá borrego assado no forno a lenha, à moda antiga, para a família que puder estar presente e com apetite. Para o ano, se Deus quiser, repetimos a dose. 


Fernando Martins


Nota: Escrito e publicado em 5 de abril de 2005

domingo, 14 de abril de 2019

Taizé - Um sonho para mim


A entrevista que a Otília Bola me concedeu para ser publicada no "Timoneiro", jornal da paróquia Nossa Senhora da Nazaré, sobre a sua peregrinação a Taizé, enriqueceu-me. Acho que todos os jornalistas saem marcados pelas entrevistas e reportagem que fazem. E marcou-me, sobretudo, quando afirmou:

“Esta participação permitiu-me uma semana de paz; pensei no que tenho andado a fazer menos bem, refleti sobre aspetos a melhorar na minha forma de atuar no dia a dia, quer no âmbito pessoal e familiar quer profissional, enquanto me permitiu uma pausa que me fortaleceu e me deu muita tranquilidade.” E acrescentou: “Regressei e ainda hoje, quando acordo, ouço aqueles cânticos maravilhosos; os cânticos de Taizé dão-me uma paz extraordinária.”

Irmão Roger
Quando um dia destes me debrucei sobre fotos encaixotadas, com vista a arrumar, com alguma ordem, as mais importantes, deparei-me com este postal ilustrado que um bom amigo me remeteu quando foi a Taizé, em 24 de fevereiro de 2012. E nele sublinhou que esteve junto à campa dos restos mortais do Irmão Roger Schütz,  fundador da comunidade de Taizé. A campa, que está assinalada, é a do lado direito.

sábado, 13 de abril de 2019

Curiosidade...



Foto de 1989: Mas que estarão estas crianças a tentar descobrir? Mistério. Quem souber, que diga.

quinta-feira, 28 de março de 2019

Painel Cerâmico de Zé Augusto

Memória de há nove anos


Na rotunda da cintura interna, na Cale da Vila, foi inaugurado um painel cerâmico do artista aveirense Zé Augusto, para assinalar a ligação ferroviária ao Porto de Aveiro e às novas estruturas rodoviárias.
Sempre gostei de arte nas ruas da cidade. De qualquer cidade e mesmo das vilas e aldeias. É uma forma positiva de educar a sensibilidade artística do povo local e de quem por elas passa. Congratulo-me, por isso.
Acresce o facto de o painel ser da autoria de um dos mais expressivos artistas aveirenses desta área, já representado, também numa obra da responsabilidade da APA (Administração do Porto de Aveiro), no paredão da Meia-Laranja, na Praia da Barra. Aqui fica o convite aos meus amigos para que passem por lá para apreciar mais este trabalho de Zé Augusto.

FM

NOTA: Publicado em 28 de março de 1910, ano do centenário da criação da freguesia e paróquia.

quarta-feira, 27 de março de 2019

Recordando o meu irmão: O menino morreu há 12 anos

Armando da Rocha Martins 

(25-10-1941 — 27-3-2007)

Ainda hoje me lembro com saudade do dia em que, empoleirado no muro frontal à nossa casa, encimado por uma rede de arame a que me segurava, o João Edmundo Ramos (primo afastado) me perguntou onde estava o meu menino Jesus. Respondi-lhe que estava a nanar, palavra que me veio de minha mãe, conhecida por Rosita Facica. E a partir daí, tanto quanto consigo recordar, passei a tratar o meu irmão por menino, mais novo do que eu três anos. Ele chamava-me mano. 
Nas conversas que mantivemos, desde sempre e até à sua morte, que ocorreu em 27 de março de 2007, nunca o tratei por Armando, o seu nome, nem ele me chamou Fernando, o meu nome. Menino e Mano ficaram para as nossas vidas, qualquer que fosse a situação em que nos encontrássemos. Para os outros, em geral, ele era o Grilo, apelido da nossa família paterna. Curiosamente, eu nunca fui considerado Grilo ou Facica, o apelido da nossa linha materna.
Três anos nos separavam e os grupos de amigos não coincidiam. Eu prossegui estudos e ele, em determinada altura, optou por trabalhar, depois de o nosso pai lhe perguntar o que é que ele queria na vida. E assim foi.
Depois de algumas experiências profissionais e de uma tentativa de emigração, acertou o passo no comércio e na indústria, onde foi figura preponderante no meio bacalhoeiro, mas não só. 
Casado com a Julita, com dois filhos, o Miguel e a Carla, ficou encantado com os dois netos, o Martim e o Levi, em quem se revia, contando-nos estórias de que se ria e nos fazia rir. Qualquer episódio, por mais simples que fosse, o meu irmão, o Menino, dramatizava-o com graça e arte, como se estivesse a representar num palco de teatro, estando, contudo, no palco da vida, onde as alegrias têm cabimento garantido, de mistura com algumas dores, próprias da nossa natureza frágil. Jamais esquecerei as suas risadas provocadas pelo Martim, que tinha em criança hábitos de chaveiro. Chaves que estivessem a jeito, bolso com elas. Eram suas e guardava-as bem guardadas para ninguém as descobrir. E contava o meu irmão que tinha de lhe telefonar para ele explicar bem direitinho onde as tinha escondido, porque sem elas não podia abrir as portas. E o Martim lá cedia.
Em 2006, quando tive o enfarte, ele ficava a olhar para mim, quantas vezes sem falar, mas eu notava no seu silêncio a inquietação que lhe ia na alma. Há silêncios que dizem mais que mil palavras. 
Recordo-o todos os dias nas minhas orações matinais, num lote de familiares e amigos que vai crescendo, ultimamente com mais intensidade. Que Deus o guarde no seu regaço maternal, para um dia, quando nos reencontrarmos, cara a cara, e nos tratarmos como sempre o fizemos, por Menino e Mano, revivermos, com todo o tempo do mundo, os momentos agradáveis da vida terrena, que os desagradáveis não os queremos lá connosco. 

Fernando, o teu mano

NOTA: Texto publicado em 31 de maio de 2021 no Pela Positiva

Reflexos de vida de Fernando Martins

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