Era por aqui, com este cenário à vista, que imensas vezes visitávamos a Ria de Aveiro. Não era a ria, mas a borda. Também por aqui andavam alguns lavradores que apanhavam o arrolado, algas e limos que a maré abandonava quando recolhia ao oceano. Os solos eram fertilizados sem grandes despesas, para além do trabalho dos interessados. E assim se transformaram areias movediças em solo produtivo.
Frequentemente se apanhavam berbigões, amêijoas, mexilhões, lingueirão de canudo e burriés, sem que as autoridades marítimas nos inquietassem. A ria era livre e o povo abastecia-se quando queria.
Há dias, em conversa com um amigo, antigo pescador desportivo, disse-lhe que em tempo de crise talvez fosse interessante voltar à nossa laguna, como quem vai passear. Logo ele retorquiu que não pensasse nisso, porque a legislação em vigor é difícil de satisfazer. É necessário licenças para tudo e mais alguma coisa. E as multas são pesadas.
Há tempos, olhei para a ria em maré baixa e divisei ao longe uma grande azáfama na apanha de berbigões, ao que julgo. Assumiram o risco ou teriam mesmo em dia as licença de que se fala? Não sei, mas talvez gostassem de sentir o prazer de caminhar no areal da ria, como quem passeia pelas ruas e jardins da nossa terra.