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Recordando as tias da Lita


Aidinha, Lourdes, Lita e Zulmira, todas bonitas
Dizem que com a idade ganhamos a tendência de olhar mais para o passado.  É o que está a acontecer comigo e com muita gente que conheço. Vai daí, vou-me dando conta de novos interesses, como os de vasculhar caixas de fotografias de tempos que não voltam. Um dia destes descobri, se assim se pode dizer, a foto que encima esta nota. E com ela surgiram as vivências que a nossa família partilhou com as tias da Lita, que foram, na prática, as “mães” dela.
O registo foi feito no jardim frente à nossa casa com marcas  que perduram desde há mais de meio século. As  tias que envolvem a juventude da Lita  (Aida, Lourdes e Zulmira) permanecem em nós pelo amor carregado de ternura que permanentemente nos dispensaram. O sorriso franco foi sempre timbre delas, cada uma a seu jeito. A tia Aida era toda carinho e  brincalhona, a tia Zulmira era a educadora de regras por vezes rígidas, mas frontal e lutadora, e a tia  Lourdes era a gestora e a protetora, ao estilo de mãe de todos.
Os nossos filhos, como já tenho dito, ficavam encantados quando sonhavam que era dia de seguirmos para Pardilhó, terra das origens delas e da Lita. E no carro até cantavam com o aproximar da chegada àquela terra onde nos sentíamos como se fora nossa. Era a festa que os esperava, o calor humano das tias que os animava, a brincadeira que a tia Aidinha (como a tratávamos) estimulava, as guloseimas que ela sorrateiramente, porque abusava,  partilhava com eles. Mas cá para nós, eu preferia o “pão do Álvaro” de sabor único.
Hei de voltar ao tema, ao sabor das fotografias achadas.

Fernando Martins

Férias em Pardilhó

Monumento ao emigrante
Largo Central
A Lita na sua terra, em visita com data imprecisa 

Em férias, onde quer que estejamos, lembramos sempre outras férias onde fomos felizes. Ainda bem, porque recordar é viver. Em Pardilhó, fomos felizes todas as férias de verão. Lá viviam as tias Zulmira e Aida, ambas solteiras e "mães" da Lita, que nutria por elas um amor carregado de ternura. Até devoção. Outra tia, a Lurdes, também "mãe", vivia em Aveiro e a Pardilhó voltava com frequência. Num ambiente de dedicação plena, partilhávamos fraternidade em tudo o que fazíamos e planeávamos. Saídas à praia da Torreira, em cuja mata passávamos horas em piqueniques previamente organizados com todo o rigor, onde nada faltava para miúdos e crescidos. 
A visita à praia, para molhar os pés, não podia fugir ao esquema. Mais para andar pelo areal e arredores do que para mergulhar nas águas normalmente frias. Não havia muito o gosto pelo mergulho nem sequer apetência pelo bronzeado. Acho que nos bastava o moreno natural da nossa pele. Havia na praia a merenda também preparada antecipadamente. Os nossos filhos, naturalmente pequenos, deliravam com o carinho dispensado pelas tias. O amor que lhes tinham era notório. 

Quando da Gafanha da Nazaré nos deslocávamos a Pardilhó, em qualquer altura do ano, a alegria deles expressava-se em crescendo evidente. Cantavam, exteriorizando o prazer que adivinhavam na hora do encontro. Certo e sabido. Nas férias de Pardilhó a saúde de todos era normal. Comia- se de tudo e nada fazia mal. Era uma alegria. Depois não faltava o encontro com outros familiares e amigos e os bancos do largo central, junto à igreja de S. Pedro, eram cúmplices de conversas infindas. Como sala de visitas da freguesia, o largo, constituído por dois espaços distintos, proporcionava o reencontro com pessoas que não se viam há muito. Nessas férias, anos e anos repetidas, havia passeios obrigatórios à Ribeira da Aldeia, com canal da ria cheio de moliceiros, bateiras e mercantéis, estaleiros à vista com carpinteiros e decoradores em ação, moliço que salta dos barcos para os carros de vacas, garotos que nadam na laguna, emigrantes que chegam e olham nostálgicos tempos que não voltam. Um ou outro pescador regressa da faina, enquanto alguns partem indagando dos melhores pesqueiros. Um serralheiro com graça e sentido comercial afixou, numa janela de sua casa, uma publicidade curiosa: "Fisgas que ensinam a pescar." Destinavam-se elas à pesca clandestina de solhas e linguados. 
Recordo ainda o pão fresco da padaria do Álvaro, de sabor único. Pão de forma normal e de coroa, este o mais apetecido. Nunca lhe conheci o segredo, mas que era excelente, lá isso era. Pardilhó era uma terra de muita migração. A falta de trabalho obrigou bastantes pardilhoenses a fixarem-se em Lisboa. A Lita, por exemplo, tinha na capital seis tios com suas famílias. Porém, nas férias, muitos vinham à terra natal para matar saudades, resolver problemas familiares e conviver com os amigos. Agosto era, sem dúvida, um mês de festa, com movimento desusado. E toda a minha família gostava das férias nesta altura do ano. 

Fernando Martins

As tias da Lita

Aida, Zulmira e Lourdes, 
as Oliveiras de Pardilhó
Aida, Zulmira e Lourdes
Aida, Zulmira e Lourdes eram conhecidas em Pardilhó, Estarreja, pelas Oliveiras. Filhas de Manuel Válega e de Ana Oliveira, as duas primeiras nunca casaram e a terceira casou tarde com António Fonseca de Pinho. Não tiveram filhos, mas assumiram  a sobrinha Hélia como filha. A Hélia era filha de Ismael Válega de Oliveira e Silva e de Maria da Luz Almeida Ramos, mas nunca viveu com eles, por razões várias.  
A Aida, conhecida por Aidinha, morreu cedo, aos 61 anos, com problemas cardíacos, ao tempo de tratamento difícil. Sempre olhei para esta tia como se fosse, e era, realmente, uma santa na verdadeira aceção da palavra: Alegre, disponível, desprendida, generosa, amiga de toda a gente, atenta aos doentes e a quem sofria. Quando anunciávamos a visita semanal, desfazia-se em amabilidades, nunca faltando as guloseimas para as crianças, que tinham pela  tia Aidinha uma adoração especial. 
A do meio, a Zulmira, era a líder do grupo. Nada se fazia sem ela dar o seu sim… Discutia as nossas decisões até acertarmos o passo com as suas opções, quando possível. Como madrinha da Lita, tudo queria orientar, qual maestrina de quem a orquestra dependia. Justa consigo própria e com os demais, cumpria rigorosamente os preceitos religiosos em que fora educada. Tal como as outras tias, diga-se de passagem.
A Lourdes era comerciante nata. Tinha em Aveiro, na Avenida Lourenço Peixinho, uma loja de fazenda e roupa interior, denominada “Lourdes de Pardilhó”. Consigo colaborava o marido, ex-emigrante no Brasil. E foi também responsável pela educação da Lita, inscrevendo-a no Colégio do Sagrado Coração de Maria que ficava perto de casa. 
A Lita, contudo, ia todos os fins de semana a Pardilhó, onde era uma menina mimada. Aí, já sabia que tinha de ouvir as recomendações da madrinha, alinhando logo que possível com os mimos e brincadeiras da Aidinha. A Zulmira era a educadora; a Aida era a cúmplice das brincadeiras.
Os nossos filhos deliravam quando íamos a Pardilhó. No carro até cantavam felizes por saberem quanto eram amados pelas tias. Olhavam para a Zulmira como quem olha para uma chefe e para a Aida como uma amiga muito próxima, que tudo aceita com uma alegria esfuziante. 
Ainda hoje, passados tantos anos, os nossos filhos a recordam com muita saudade. Tal como nós.

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  Quando vou ao Porto, a capital do Norte, lembro-me com frequência dos painéis que decoram a sala de entrada da Estação Ferroviária. Nunca ...